quinta-feira, 16 de maio de 2013

A CONSTRUTORA PODE COBRAR JUROS ANTES DA ENTREGA DAS CHAVES DE IMÓVEL ADQUIRIDO NA PLANTA?

Várias pessoas tem nos procurado para tirar dúvidas a respeito da legalidade do reajuste do saldo devedor de imóveis comprados na planta antes da entrega das chaves.
Para esclarecer a questão, elaboramos um artigo simples e de fácil entendimento  sobre o tema,  e que contém o posicionamento dos Tribunais, mais especificamente do STJ sobre a questão. Para tanto, devemos dividir a presente análise em duas fases: antes e depois do ano 2012.
No ano de 2010 o STJ consolidou o posicionamento de ser ilegal a cobrança dos denominados “juros no pé”, ou seja, aquele reajuste feito antes da entrega das chaves ao proprietário de imóvel em construção, sob os seguintes fundamentos:
- Com a promessa de compra e venda, como o próprio nome já diz, não há verdadeiramente uma compra e venda, mas simplesmente uma promessa, pois  nem o comprador usufrui do bem, nem o vendedor goza integralmente do preço.  O contrato, sob essa ótica, ostenta cunho estritamente obrigacional. Em contratos de promessa de compra e venda de imóvel não construído, o preço integral do imóvel somente é exigido pelo vendedor quando da entrega das chaves, ocasião em que o consumidor deverá pagá-lo, com as próprias forças, ou mediante financiamento bancário.
- A construtora, na maior parte das vezes, visando capitalizar-se para erguer o empreendimento busca recursos tanto no mercado financeiro quanto junto aos promitentes compradores. A Súmula nº 308 do STJ evidencia o posicionamento então adotado: "A hipoteca firmada entre a construtora e o agente financeiro, anterior ou posterior à celebração da promessa de compra e venda, não tem eficácia perante os adquirentes do imóvel". Nota-se que o consumidor não adquire nem usufrui de capital alheio, financeiro ou imobilizado durante a obra. Na verdade a construtora é que se capitaliza com recursos de instituições financeiras e particulares promitentes compradores.
No entanto, no ano de 2012 o STJ mudou seu posicionamento acerca do tema, passando a considerar legal a cobrança dos chamados “juros no pé”, afirmando, em suma, que não existe venda a prazo com preço de venda à vista.  A reversão do entendimento apresentou os seguintes fundamentos:
- A compra de um imóvel na planta facilita o acesso à moradia, além de constituir um excelente investimento para o comprador, pois o mesmo adquire o bem com valor bastante inferior ao preço do imóvel pronto.
- Se o incorporador oferece prazo adicional para o comprador pagar, mediante parcelamento do preço, é um favorecimento financeiro ofertado.
Aqueles que pagam o preço à vista devem obter alguma vantagem na compra além do que opta pela compra parcelada.
PAGAMENTO DE ALUGUEIS POR ATRASO EM ENTREGA DE OBRA OU IMÓVEL

Antes de atacar diretamente o tema, tão comum atualmente, que as pessoas já até esperam por ele, é preciso destacar que o atraso na entrega de imóveis tem sido protegido por contratos leoninos, quase sempre de adesão, que apresentam termos técnicos complicados, se desdobram em outros documentos e planilhas que quase sempre confundem o consumidor, mas é preciso ser persistente nesses casos e exigir todos os esclarecimentos devidos em relação ao atraso e sim, se for injustificado, caberá a reparação pela demora excessiva.

É comum que os contratos firmados entre as chamadas incorporadoras direto com os clientes finais, normalmente estabelecem uma cláusula em que se estipula que a obra poderá sofrer um atraso de até 180 dias, independente do motivo. Alguns chegam  mesmo a estipular a possibilidade de atrasos de 180 dias úteis, o que elastece e muito o prazo inicial de entrega da obra.

É claro que é razoável que o contrato faça previsão de atrasos, até porque, um empreendimento de grande porte está sim sujeito a determinadas situações imprevistas, mas no geral, não ocorrem mudanças significativas capazes de justificar que se aumente o prazo de construção em mais da metade, uma vez que no mais das vezes o prazo total é de 24 a 30 meses. Imaginemos, a título de exemplo que, em um contrato de 24 meses, a incorporadora tenha o direito de atrasar a entrega do imóvel em 9 meses, fazendo acrescer quase um ano ao tempo de espera pela entrega do bem.

A maioria das pessoas, enquanto espera esse bem, mora de aluguel, mora com os pais, adia casamentos, entre tantas situações possíveis que não se pode prever e são essas situações que geram o dever de indenizar. Enquanto poderia já estar usufruindo o bem, o consumidor é obrigado a esperar, sem necessidade de justificativa, pela entrega da sonhada casa própria.

A nossa jurisprudência já trata do tema com certa propriedade e segurança, definindo situações como as citadas a cima, em que a abusividade fica clara, mas como os contratos nessa esfera costumam ser bastante complexos, cada caso deverá ser analisado individualmente.

Além disso, ao firmar um contrato de aquisição de imóvel, o consumidor precisa ficar atento a outros pontos importantes que podem onerar a sua aquisição que são as taxas de corretagem: a jurisprudência já reconhece que se não prevista em contrato, a taxa de corretagem não poderá ser cobrada do adquirente, devendo ser integralmente suportada pelo vendedor. Muito comum também, é a cobrança de taxas condominiais, ou de outras taxas não previstas no contrato, o que também vem sendo firmemente combatido pela jurisprudência, amparada pelo direito do consumidor.

Muitos consumidores têm em mente que ao assinar o contrato estão concordando com tudo que ali está definido, quando na verdade não há oportunidade de escolha. E isso não ocorre somente em contratos imobiliários, costuma ocorrer em todos os tipos de contrato de adesão, pois vigora em nosso ordenamento jurídico, uma banalização dos contratos de adesão. A partir disso, a doutrina mais balizada já vem afirmando, com apoio dos tribunais superiores, que reconhecendo tamanha expansão dos contratos de adesão, não há mais que se falar em autonomia da vontade e princípios contratuais como o pacta sunt servanda – o pactuado deve ser cumprido, estão sendo mitigados para abrir espaço a uma nova visão que deixa claro que modernamente, a função social dos contratos, escorada no direito civil constitucional, estabelece uma nova ordem: a função social de formalizar contratos deixa de ser a segurança jurídica e passa a ser o atendimento aos interesses da pessoa humana, de forma que os bens existenciais, constitucionalmente previstos, têm prevalência sobre os interesses meramente patrimoniais.

Os exemplos são fartos. No afã de não perder com essa nova onda de interpretações jurisprudenciais, as incorporadoras vem aderindo na uma nova prática, claramente abusiva, de convidar o adquirente a assinar um termo de renúncia de direitos em troca de uma indenização irrisória quando percebem que a reparação judicial lhe traria desvantagens.

Assim, em contratos onde existe previsão contratual de aplicação de multa em caso de atraso na entrega do bem, que agora estão sendo fixadas em um por cento desse valor – montante considerável se imaginarmos o preço de cada imóvel nesses tempos de expansão imobiliária, em um condomínio com dezenas de apartamentos ou casas.

Neste quesito porém, é imperioso esclarecer que esse tipo de acordo só teria validade se homologado judicialmente. E aí cabem sim muitas discussões, mas a regra é os contratos serão interpretados de forma a proteger o consumidor, parte hipossuficiente na maior parte das relações de consumo.
O que não podemos nos cansar de repetir no entanto, é que o assunto é demasiado complexo para que se esgote em pouca linhas como aqui nos propusemos a tratar, mas se há dúvida, se há mal entendidos, procure sempre os esclarecimentos de um advogado.

quinta-feira, 9 de maio de 2013

JUIZ CONDENA HOSPITAL PELA RETIRADA DE ÚTERO DE PACIENTE


Essa semana o sítio do TJDFT publicou a notícia de que o Juiz de Direto Substituto da 6ª Vara Cível de Brasília condenou o Hospital Santa Helena a indenizar uma paciente em R$ 25.000,00 a título de danos morais. A condenação foi motivada pela realização de retirada do útero da paciente após uma cesariana. Cabe recurso da decisão.

A autora afirma a responsabilidade do Hospital Santa Helena e dos médicos, que promoveram seu atendimento, em consulta pré-parto, no ato cirúrgico de realização da cesariana e no atendimento médico, que culminou na histerectomia (retirada do útero). Segundo a autora houve falta de cuidado dos médicos que lhe atenderam, pois dias antes do parto, já reclamava da perda de líquido para o médico, e após o parto, passou a se queixar de dores, e ainda assim obtivera alta hospitalar. Ao retornar dias após no hospital, não obtivera o adequado atendimento médico. Segundo a paciente, na situação houve um quadro de negligência, que culminou na histerectomia.

Os réus contestaram alegando a ausência de responsabilidade em relação ao evento, em face do devido atendimento da paciente, com destaque para o fato de que a histerectomia ocorreu em face da existência de placenta acreta, sem qualquer culpa dos profissionais pela situação. Os réus médicos apontam que a autora não conseguiu atribuir qualquer tipo de evento causador da conduta deles no evento ocorrido. Por fim, requereram a improcedência do pedido da autora.

O Juiz de Direto Substituto decidiu que “como é notório, a manipulação de pacientes, sem o adequado procedimento de afastamento de campos de risco infecciosos dentro de um ambiente hospitalar pode levar ao fato relatado pela autora. Embora os profissionais da saúde não respondam pelo evento sem que se demonstre a culpa na conduta individualizada de cada um, prescindível se torna a comprovação da culpa para a responsabilização do hospital - art. 14, caput, do CDC. Faz-se presente a responsabilidade objetiva para o hospital, diferentemente dos profissionais médicos que se exige a comprovação da culpa ou dolo. Houve uma falha na prestação do serviço, eis que do ato de realização de uma cesárea decorreu um processo inflamatório, infeccioso, com a conseqüente histerectomia. Deste modo, a primeira ré deve responder pelo dano estético sofrido pela autora”.

Fonte: http://www.tjdft.jus.br/institucional/imprensa/noticias

INSCRIÇÃO INDEVIDA EM CADASTRO DE INADIMPLENTES POR OPERADORA DE CELULAR GERA INDENIZAÇÃO

O título não apresenta nenhuma novidade, mas apesar do crescimento da divulgação dos direitos dos consumidores pelas redes sociais, as operadoras de celular ainda praticam as mesmas condutas ilegais com o cliente, fazendo com que o mesmo seja submetido a situações muitas vezes vexatórias por descobrir que seu nome foi inscrito no cadastro de inadimplentes da pior forma possível: Quando tenta efetuar uma compra e tem o seu cadastro recusado.
Nosso escritório possui algumas ações em curso em que a Tim Celular S.A figura como ré. Todas as que já foram julgadas obtiveram sentenças favoráveis dos juízes no sentido de condenar a operadora de celular a pagar ao cliente um valor a título de indenização por danos morais.

Nos últimos dias, em um caso análogo o Juiz de Direito Substituto 4ª Vara Cível de Brasília condenou a Tim Celular S.A a pagar a cliente a quantia de R$5.000,00, por danos morais, uma vez que inscreveu indevidamente  seu nome no banco de dados dos inadimplentes.

O cliente alegou ter sido surpreendido com a negativa de crédito para financiamento de um imóvel em face da inscrição de seu nome no cadastro de inadimplentes do SPC por iniciativa da requerida em razão de uma suposta dívida no montante de R$ 49,16. Narrou que a cobrança era referente a uma fatura com vencimento no mês de julho de 2009, sendo que não era mais cliente da requerida desde fevereiro daquele ano.

A Tim  alegou que a dívida que ensejou a inscrição do autor nos cadastros de inadimplentes foi regularmente constituída, porquanto referente à contraprestação de serviços devidamente usufruídos.

Em sua sentença o juiz afirmou: “da análise detida dos autos, verifico ser, de fato, indevida a inscrição do nome do autor no banco de dados dos inadimplentes. Isso porque, conforme se atesta documento, o requerente solicitou a portabilidade para outra empresa de telefonia em 12.02.2009, momento em que encerrou o seu contrato de prestação de serviços com a requerida. A cobrança objeto de controvérsia é referente ao mês de julho de 2009, isto é, momento posterior ao cancelamento dos serviços. E, ainda que se considere a alegação da requerida no sentido de se tratar de débito remanescente, relativa ao último ciclo de faturamento, restou demonstrado nos autos o pagamento da fatura. Assim, demonstrada a inadequação do procedimento de cobrança adotado pela ré, bem como o ato ilícito praticado, impõe-se o dever de indenizar. Fixo em R$ 5.000,00 o montante a ser indenizado ao autor".

domingo, 5 de agosto de 2012

O princípio da força obrigatória do contrato e a ação revisional

Uma das questões mais frequentes levantadas pelos clientes que nos procuram para a propositura da ação revisional é: “como posso contestar um contrato que assinei e, por consequência, concordei com suas cláusulas?” Para que possamos responder a questão é necessário discorrer sobre o princípio da força obrigatória do contrato e sua relativização. 
O princípio da força obrigatória dos contratos, proveniente da expressão latina pacta sunt servanda, significa que o contrato é a lei entre as partes, ou seja, ele tem força obrigatória e não pode ser modificado. Na concepção clássica, o princípio da força obrigatória dos contratos era absoluto, o que significa que as partes deveriam cumprir o contrato exatamente da forma como foi pactuado, independente da continuidade das condições das partes à época do comprometimento.
Essa informação ganha relevância na medida em que atualmente a maioria dos contratos de consumo é de “adesão”, onde a instituição financeira possui um contrato padronizado, com cláusulas previamente definidas, cabendo ao consumidor apenas aceitá-lo em bloco, sem discussão, seja em face da sua vulnerabilidade técnica seja em face da falta de alternativa.
No entanto, após a Constituição Federal de 1988 (CF/88), houve uma significativa relativização na obrigatoriedade e imutabilidade das cláusulas contratuais, que devem ser interpretadas segundo os princípios da dignidade da pessoa humana, da função social do contrato e da boa fé objetiva, sobre os quais discorreremos a seguir.

Dignidade da pessoa humana

A dignidade da pessoa humana é considerada um princípio superior a qualquer outro previsto na CF/88. Não se trata de um direito, porque direitos são renunciáveis, enquanto que a dignidade não. Então, se o referido princípio não é passível de renúncia, ele não pode faltar em qualquer circunstância do Direito.
Para Edilsom Pereira de Farias, na obra “Colisão de Direitos na relação entre honra, intimidade, vida privada e imagem versus liberdade de expressão e informação", a dignidade da pessoa humana consiste num princípio que é “fonte jurídico-positiva dos direitos fundamentais”:
"(...) imbricado ao valor da pessoa humana está o princípio ético-jurídico da dignidade da pessoa humana. Ou seja, o valor da pessoa humana é traduzido juridicamente pelo eminente princípio fundamental da dignidade da pessoa humana. Este significa a objetivação em forma de proposição jurídica do valor da dignidade do homem. (...) O princípio fundamental da dignidade da pessoa humana cumpre um relevante papel na arquitetura constitucional: ele constitui a fonte jurídico-positiva dos direitos fundamentais. Aquele princípio é o valor que dá unidade e coerência ao conjunto dos direitos fundamentais. Dessarte, o extenso rol de direitos e garantias fundamentais consagrados pelo título II da Constituição Federal de 1988 traduz uma especificação e densificação do princípio fundamental da dignidade da pessoa humana (art. 1°, III). Em suma, os direitos fundamentais são uma primeira e importante concretização desse último princípio, quer se trate dos direitos e deveres individuais e coletivos (art. 5°), dos direitos sociais (art. 6° a 11) ou dos direitos políticos (art. 14 a 17)". (Edilsom Pereira de Farias. Colisão de direitos: a honra, a intimidade, a vida privada e a imagem versus a liberdade de expressão e informação. 2. ed. Porto Alegre: Sergio Antonio Fabris Editor, 2000.

Função Social do Contrato

De acordo com a nova forma de interpretar o Direito Privado em decorrência da evolução das garantias pessoais, a perspectiva funcional passou gradualmente a ganhar maior destaque no cenário hermenêutico, se sobrepor à análise puramente conceitual e estrutural dos institutos jurídicos. A questão central na análise dos contratos na atualidade é se sua finalidade está sendo cumprida, pois "na perspectiva funcional, os institutos jurídicos são sempre analisados como instrumentos para a consecução de finalidades consideradas úteis e justas." (Pablo Renteria, Considerações à cerca do atual debate sobre o princípio da função social do contrato. in Princípios do Direito Civil Contemporâneo, Renovar, 2006)
O antigo princípio do pacta sunt servanda, portanto, pode e deve sofrer mitigações para se adequar aos princípios constitucionais e da legislação civilista, ou seja, os contratos devem visar, fundamentalmente, uma função social e a satisfação dos interesses das partes contratantes, em cooperação.
Dessa forma, se o contrato celebrado satisfaz apenas a um lado da relação, prejudicando o outro, o pacto não cumpre sua função social. Nessa situação, deve o Judiciário promover o re-equilíbrio contratual através da revisão das cláusulas prejudiciais a uma das partes.
Note-se que, na teoria contemporânea do Direito Contratual, impõe-se uma mudança radical na interpretação das obrigações, que não podem mais ser consideradas apenas como uma garantia do credor (relação de subordinação), mas como uma relação de cooperação entre credor e devedor.
O conceito moderno do contrato vai além e interessa a toda comunidade social, não somente às partes contratantes, como antes. A idéia de função social está relacionada com o conceito de finalidade e não se pode afastar seu fundamento constitucional, principalmente em relação à dignidade da pessoa humana.
O Código Civil Brasileiro condiciona expressamente a liberdade contratual à função social. O professor Flávio Tartuce ensina que o principal enfoque é justamente equilibrar as relações jurídicas, sem preponderância de uma parte sobre a outra, resguardados os interesses do grupo social também nas relações de direito privado. (Função Social dos Contratos: do Código de Defesa do Consumidor ao Código Civil de 2002 . São Paulo: Editora Método, 2007).

A Boa-fé objetiva

A boa-fé objetiva é um princípio geral que estabelece um roteiro a ser seguido nos negócios jurídicos, inclui normas de condutas que devem ser observadas pelas partes ou, por outro lado, restringe o exercício de direitos subjetivos ou, ainda, como um modo hermenêutico das declarações de vontades das partes de um negocio, em cada caso concreto.
Somente com o Código do Consumidor, em 1990, a boa fé objetiva foi consagrada no ordenamento jurídico pátrio. Garantida constitucionalmente, essa modalidade de boa-fé começou a ser utilizada para interpretar contratos, garantindo integração de obrigações pactuadas. Dessa forma, mostra-se absolutamente fundamental para que as partes de um negócio jurídico possam agir com lealdade perante a outra até o cumprimento das obrigações pactuadas.
Segundo Maria Teresa Negreiros, na obra Teoria do Contrato, "o princípio da boa-fé impõe um padrão de conduta a ambos os contratantes, no sentido da recíproca cooperação, com consideração dos interesses um do outro, em vista de se alcançar o efeito prático que justifica a existência jurídica do contrato celebrado". (NEGREIROS, Teresa. Teoria do Contrato . Rio de Janeiro: Renovar, 2006, p. 12305)
O artigo 51, IV, do Código de Defesa do Consumidor, considera nulas as cláusulas contratuais relativas ao fornecimento de produtos e serviços que sejam incompatíveis com a boa-fé. Já o artigo 422, do Código Civill, estabelece que os contraentes são obrigados a guardar os princípios da probidade e da boa-fé. Dessa forma, a boa-fé objetiva exige um dever de conduta, ética, lealdade e colaboração na execução do contrato.
Não se pode dizer, portanto, que está presente a boa-fé objetiva em um contrato de adesão, o qual permite uma série de vantagens e lucros exorbitantes a um dos contratantes, resultantes, por exemplo, de estipulação de taxas de juros muito superiores ao razoável de uma economia estabilizada e com baixos índices de inflação.

A onerosidade excessiva como fator determinante para a revisão contratual

Com a edição do Código de Defesa do Consumidor, adotou-se uma postura mais objetiva na análise das cláusulas contratuais e na revisão contratual por circunstâncias supervenientes. Atualmente, o único requisito necessário para que seja autorizada a revisão contratual é a onerosidade excessiva.
Diante disso, a onerosidade excessiva não precisa ser superveniente, podendo ser originária, ou seja, desde a formação do contrato, pois a condição de vulnerabilidade do consumidor não lhe permite a compreensão da vantagem manifestamente excessiva em favor do fornecedor do crédito.
Dessa forma, atualmente o cerne do princípio da força obrigatória dos contratos é a igualdade substancial nas relações contratuais e, por conseqüência, o equilíbrio entre as posições econômicas dos contratantes. Ao contrário do equilíbrio meramente formal, busca-se agora que as prestações em favor de um contratante não lhe acarretem um lucro exagerado em detrimento do empobrecimento do outro contratante. Em face das diferenças no poder negocial entre os contratantes, a disciplina contratual moderna cria mecanismos de proteção da parte menos favorecida, como é o caso da revisão contratual e consequente redução das prestações.

quarta-feira, 25 de julho de 2012

A PRESCRIÇÃO TRIBUTÁRIA E A INTERPRETAÇÃO DADA PELA LEI COMPLEMENTAR Nº 118/2005, NOS TRIBUTOS SUJEITOS AO LANÇAMENTO POR HOMOLOGAÇÃO



       

Este breve estudo tem o objetivo de esclarecer o prazo prescricional, naquelas demandas que envolvam o pagamento a maior ou indevido dos tributos sujeitos ao lançamento por homologação. Para fins didáticos, trataremos especificamente de um tributo cujo lançamento ocorre por homologação: O imposto de renda.

Inicialmente, precisamos definir o que é lançamento por homologação. O lançamento por homologação, acentuado no art. 150 do CTN, ocorre quando o sujeito ativo (Receita Federal), apenas confere e apura o pagamento realizado pelo sujeito passivo. Isso é exatamente o que ocorre com o Imposto de Renda. Somos nós contribuintes, que verificamos a ocorrência do fato gerador, calculamos o montante devido e efetuamos o pagamento.

Sobre o fato gerador do Imposto de Renda, basta sabermos que se trata da aquisição da disponibilidade econômica ou jurídica de renda, assim entendido o produto do capital, do trabalho ou da combinação de ambos.

Depois que nós realizamos o acerto com a Receita Federal, referente ao Imposto de Renda, este órgão tem 5 (cinco) anos para homologá-lo, contados da ocorrência do fato gerador. Acontece que a Receita nunca vai atrás de cada cidadão ou empresa para homologar o lançamento efetuado, portanto, considera-se homologado o lançamento e definitivamente extinto o crédito, com o decurso do prazo de cinco anos, porque assim preceitua o §4, do art. 150 do CTN.

Esclarecendo o que foi dito no parágrafo anterior, a Receita Federal dispõe de cinco anos para verificar alguma falsidade, erro ou omissão quanto a qualquer elemento
definido na legislação tributária como sendo de declaração obrigatória. Esta é a razão de muitos alertarem sobre a guarda de documentos por até cinco anos. Transcorridos este prazo, está definitivamente extinto o crédito tributário.

Até o momento, discorremos sobre alguns conceitos fundamentais e esclarecemos sobre os cinco anos para que ocorra homologação e a conseqüente extinção do crédito tributário. Passaremos agora a tratar do prazo prescricional para demandar a Receita Federal, quando o sujeito passivo faz um pagamento a maior ou indevido do Imposto de Renda.

Inicialmente, é imperioso esclarecermos que no caso de pagamento indevido, o contribuinte dispõe de cinco anos a contar da extinção do crédito tributário para pleitear a repetição de indébito. Esse prazo está devidamente assinalado no inciso I do art. 168 do CTN.

O entendimento anterior do STJ era o seguinte: nos tributos sujeitos a homologação, o contribuinte tinha o dever de antecipar o pagamento, sem que houvesse, no entanto, um exame prévio da autoridade administrativa. Caso não ocorresse a chamada “homologação expressa” do lançamento, dizia-se que houve a “homologação tácita” e a consequente extinção definitiva do crédito, 5 anos após a ocorrência do fato gerador, conforme descrito no art. 150, § 4 do CTN.

O direito de pleitear a restituição do tributo pago indevidamente sujeito ao lançamento por homologação, quando a mesma não se efetiva de maneira expressa, somente cessaria após o transcurso do prazo de cinco anos, contados a partir da data da homologação tácita. Fácil perceber com tudo o que expusemos até o momento, que em tese teríamos 10 (dez) anos para demandar a Receita Federal no caso em comento.

O entendimento acima, conhecido como a tese dos 5+5, prevaleceu no Superior Tribunal de Justiça (STJ) até a edição da Lei Complementar 118/2005. Consideravam- se os primeiros cincos anos da extinção do crédito pela homologação tácita da Receita, mais os cinco anos para ingressar com ação de repetição do indébito, o que resultava em dez anos para o contribuinte demandar a Receita na justiça.

Com a edição da Lei Complementar 118/2005, a contagem dos 5+5 deixou de ser aplicada. Esta lei prevê no artigo 3° “…que a extinção do crédito tributário ocorre, no caso de tributo sujeito a lançamento por homologação, no momento do pagamento antecipado…”. Com isso, a extinção do crédito e o conseqüente prazo de cinco anos para demandar a Receita começa a fluir do pagamento antecipado e não mais da homologação do lançamento, ou seja, o prazo de cinco anos corre a partir da data do pagamento.

Após o advento da LC 118/05, o STJ modificou um pouco o seu posicionamento, que passou a ser consubstanciado nas consequências relacionadas à prescrição. Após a referida LC, a prescrição passaria a ser contada da seguinte forma: Com relação aos pagamentos efetuados a partir da sua vigência (09.06.05), o prazo para requerer a repetição de indébito seria de 5 anos contados da data do pagamento. Para os pagamentos feito em data anterior à vigência da LC, a prescrição obedeceria ao regime previsto no sistema consagrado anteriormente, limitada ao prazo máximo de 5 anos a contar da vigência da lei nova.

Recentemente, no entanto, a 1ª Seção do STJ, modificou o entendimento citado anteriormente, se alinhando ao posicionamento do Supremo Tribunal Federal proferido no julgamento do Recurso Extraordinário (RE) 566.621, e firmou entendimento de que deve ser levada em consideração para o novo regime a data do ajuizamento da ação.

Com efeito, passou a entender que o referido dispositivo aplicar-se-ia para as ações ajuizadas a partir da LC 118/2005, e não mais aos pagamentos efetuados. Assim, nas ações ajuizadas antes da vigência da LC 118, aplica-se o prazo prescricional de dez anos a contar da data da ocorrência do fato gerador (tese dos 5+5). Já nas ações ajuizadas a partir de 9 de junho de 2005, data de entrada em vigor da LC 118, aplica-se o prazo prescricional de cinco anos contados da data do pagamento indevido.

domingo, 22 de julho de 2012

Juizado Especial x Justiça Comum. Por qual optar?


Juizado Especial x Justiça Comum. Por qual optar?

Em ações que versem sobre direito do consumidor, cujos valores não ultrapassem vinte salários mínimos, muitas vezes o cliente fica na dúvida sobre contratar um advogado ou ingressar pessoalmente com o feito nos juizados especiais cíveis.

A seguir discorreremos sobre alguns aspectos de ambos, o que ajudará o cliente a refletir e optar pelo procedimento mais vantajoso para ele.

  1. Celeridade
As causas que podem ser apreciadas sem o acompanhamento de um profissional com inscrição nos quadros da OAB são aquelas que não ultrapassam 20 salários mínimos (essa limitação se aplica exclusivamente à justiça estadual, pois caso a demanda deva ser proposta no âmbito federal, não há limite máximo para a postulação pessoal, desde que o valor não ultrapasse aquele estabelecido pela lei 10.259/01).
A tramitação nos Juizados Especiais é mais célere do que na Justiça Comum, mas ainda está muito longe do ideal almejado pelo legislador originário. A relação quantidade de processos/servidores, é alta, ou seja, não há servidores suficientes para o excessivo número de processos distribuídos às varas, e isso faz com que as audiências inaugurais demorem para serem marcadas. No caso específico do Distrito Federal, esse tempo tem variado entre dois e quatro meses, o que não caracteriza uma diferença significativa com relação à propositura da ação na justiça comum.

  1. Custas Processuais
Nesse aspecto muitas pessoas se enganam. É verdade, não há custos para ingressar com a ação no Juizado Especial. E vale a pena, desde que não haja necessidade de recurso para as Turmas do Juizado Especial.
Em caso de recurso, paga-se o valor do preparo, que é FIXO, independente do valor da ação, e gira em torno de R$ 400,00 (quatrocentos reais) no Distrito Federal. Somente haverá dispensa do pagamento do preparo, nos casos em que o juiz deferir a justiça gratuita.
Então, se o Autor ingressar com uma ação de R$ 1.000,00, por exemplo, e perder, para que a Turma Recursal analise o seu apelo recursal ele terá que desembolsar R$ 400,00, e ainda corre o risco de ter que arcar com os honorários sucumbenciais, geralmente fixados em 10% do valor da causa, além de ser obrigado a estar representado por um advogado.
Supondo que a mesma ação tramitasse na Justiça Comum, o autor deveria pagar apenas um percentual do valor da causa para ingressar com a ação e, caso haja a necessidade de recurso, mais um total de aproximadamente R$ 12,00.

  1. Honorários Advocatícios
A questão dos honorários talvez seja a que mais contribui para que o Autor opte pela propositura da ação nos Juizados Especiais, em detrimento da Justiça Comum. É natural o pensamento de que vai economizar por não ser obrigado a contratar um advogado, e vai mesmo, mas somente se a ação terminar com a sentença do juiz e não houver necessidade de atuação junto às Turmas Recursais. Se houver a necessidade do recurso, além da obrigatoriedade de contratar um advogado, ainda será necessário o pagamento do  preparo.
Outra opção é ingressar a ação com um advogado constituído desde o início.e, nesse caso específico, é maior a ênfase para que o Autor escolha a Justiça Comum, pois o advogado sabe que no Juizado Especial receberá apenas o valor acordado com o cliente a título de remuneração pelos serviços prestados. Caso a demanda seja proposta na Justiça Comum, o advogado tem a possibilidade de reduzir o valor cobrado do Autor da ação, uma vez que poderá contar com os honorários de sucumbência no caso de um desfecho positivo.

  1. Desenvolvimento da tese e do valor da indenização
É necessário agregar esses dois argumentos em um só tópico, pois os mesmos estão intrinsecamente relacionados, uma vez que o valor da indenização nos Juizados Especiais é limitado e que não há espaço para o desenvolvimento de uma tese diferenciada pelo Autor.
Quando o Autor decide ingressar com ação contra uma empresa específica, ele espera obter o que lhe foi negligenciado na prestação do serviço ou na aquisição de um produto, mesmo que aquela situação inicial não possa ser recriada às mesmas condições da época da lesão.
É nesse ponto que nasce a tese que será trabalhada pelo advogado do Autor, demonstrando o dano sofrido e a possibilidade de ser reestabelecida a situação anterior a este ou a consequente compensação financeira.
Dessa forma, existe a tese de que a empresa deve ser punida para não voltar a cometer os mesmos danos com outros consumidores, o que representa o caráter punitivo da indenização. Ocorre que esse argumento é muito limitado no âmbito dos Juizados Especiais, pois o julgador, ao limitar a indenização pleiteada a valores ínfimos para as empresas, acaba por não aplicar o caráter punitivo pleiteado pelo Autor. Para exemplificar: o Autor, lesado em R$ 500,00 por uma grande empresa, recebe o valor da lesão a título de danos materiais e uma indenização por danos morais de R$ 1.000,00 pedida a título de punição pela conduta da empresa. No final do processo o mesmo obteve o ressarcimento do prejuízo suportado, mas a empresa não sofreu o caráter social da condenação à indenização, qual seja, a punição (financeira) para que não pratique mais condutas dessa natureza com outros consumidores.
Na Justiça Comum, por sua vez, o advogado do Autor pode desenvolver uma tese de forma mais complexa, tendo em vista que provavelmente não terá o valor da indenização previamente limitado.

  1. Fase Recursal
Os Juizados Especiais contam com Turmas Recursais para analisar os recursos propostos pelas partes não satisfeitas com o teor da sentença proferida pelo Juiz. No entanto, em regra, o processo termina nesse ponto. Caso a Turma Recursal não modifique a sentença, cabe ao Autor se conformar com a decisão e arcar com o prejuízo dos honorários sucumbenciais. Os casos que permitem que o recurso seja analisado por outro Tribunal são poucos, pois necessitam do preenchimento de requisitos muito específicos. 
Já no caso da Justiça Comum, existem vários caminhos para a reforma de uma decisão desfavorável, não se esgotando esta possibilidade na análise do primeiro recurso interposto pela parte insatisfeita.
Nesse sentido, o Autor deve refletir sobre cada um dos aspectos explicitados acima para que chegue à conclusão acerca da melhor forma de propor a ação pretendida.
Ressalta-se, ainda, que a situação acima relatada se refere a uma ação consumerista, onde o Autor se sente lesado por algum comportamento de uma empresa qualquer e procura a justiça para reverter o seu prejuízo, material ou moral. Em outros casos há mais fatores a serem considerados, os quais serão discutidos neste espaço oportunamente.